quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

Minha primeira ida sozinho a um estádio de futebol

Ainda bastante incomodado com a história do jovem boliviano de 14 anos, Kevin Douglas Beltran Espada, morto com um tiro de sinalizador naval atingindo seu rosto após esta "arma" ser disparada por um torcedor do Corinthians, dentro do estádio do San José, em Oruro, Bolívia, comecei a relembrar o meu primeiro jogo sozinho em um estádio de futebol.

Diferentemente de Kevin, que percorreu 230 km para assistir sua primeira partida em um campo de futebol acompanhado de amigos e responsáveis, o primeiro jogo que me recordo de ter ido sozinho foi aos 12 anos de idade, porém na rua de casa. Nascido em Belo Horizonte, mas criado na Rua Turiassu, em São Paulo, a 500 metros do estádio Palestra Itália, no ano de 2000 foi a primeira vez que meu pai me autorizou a ir ao estádio só.

Daquele dia em diante, só fui cair na estrada pela primeira vez sozinho já em 2009, aos 21 anos de idade. Muito tempo depois da primeira partida do lado de casa, dessa vez eu ia conhecer o gigante Maracanã. Tomei um ônibus na Rodoviária do Tietê na manhã daquele dia 10 de outubro, feriado de Nossa Senhora de Aparecida, e parti rumo a Cidade Maravilhosa.

Já tinha meus 21 anos e fui com bastante receio, e também muito contra vontade de meu pai, que nos tempos de jovem cansou de viajar a Belo Horizonte para assistir o Cruzeiro de Tostão jogar, ou ao Maracanã assistir Zico e cia. Até hoje, já tenho 25 anos, qualquer frase que eu falo para o velho "acho que vou para Curitiba" ou "acho que vou para Porto Alegre" acredito que meu pai perde uns fios a mais de cabelo.

Voltando a história, a partida escolhida foi simplesmente uma final de Copa Mercosul. Nos anos de 1998, 1999 fui em muitas partidas do Palmeiras, umas por esse mesmo torneio continental, vencido pelo Verdão dois anos antes, outras por campeonatos como Paulista, Brasileiro e Copa do Brasil. Era do lado de casa. Ingresso nunca foi problema, tempo também nunca me faltou. Era só atravessar a Av. Pompéia e caminhar 300 metros.

Era dia 20 de dezembro de 2000. Convenci o velho a me deixar ir ao jogo. Setor muito bem escolhido: torcida do Vasco. Em Minas Gerais e São Paulo sempre tive times de preferência, mas no Rio de Janeiro já tive simpatia pela maioria, mas acredito que pela rivalidade com o Estado de São Paulo, nunca cheguei a torcer pela vitória de algum com muita vontade.

Encolhidos no cantinho do Parque Antártica, no espaço dos visitantes que ficava bem próximo ao conjunto aquático, no primeiro tempo assisti o Palmeiras fazer 3x0. Curiosamente, todos os três gols do lado oposto de onde eu estava. Confesso que para o visitante, ali a visão é péssima. Arce, Magrão e Tuta marcaram para o time da casa.

No intervalo o que se via era a torcida do Vasco desolada. Já aceitando a derrota, que daria ao Palmeiras o bicampeonato do torneio. Porém, o inacreditável aconteceu. O Vasco viraria a partida, com 3 gols do baixinho Romário e um do também baixinho Juninho Paulista. De novo todos os gols seriam marcados ao lado aposto de onde eu estava. Muita sorte, não?

Não sei se nunca esquecerei dessa partida pelo resultado, uma virada de 3x0 para 4x3, que não acontece todo dia, ou se porque pela primeira vez presenciei a idolatria de uma torcida pelo seu comandante. Não digo que o comandante era o técnico ou o artilheiro da camisa 11, mas sim o presidente, Eurico Miranda.

Cresci com duas noções futebolísticas muito definidas pelo meu pai: nunca gostar do Vasco, pois Eurico Miranda representava algo que ele detestava, e também nunca torcer pelo Alvinegro de Parque São Jorge, que pra ele era a regra 1 para eu poder assistir futebol. Ao fim da partida, os torcedores gritavam tanto o nome de Eurico, quanto dos jogadores e do time.

No dia seguinte, para piorar o desgosto do meu velho, meu tio vascaíno, casado com sua irmã, entrou em casa gritando "Vaaascccoooo". Naquele dia, a reação do meu pai foi tanta, que eu nunca mais simpatizei com o time da Colina de novo. Creio que durou apenas algumas horas na noite anterior.

Agora, o porquê dessa história? Bom, tento me colocar no lugar dos pais de Kevin, pois não saberia como reagir se fosse um filho, parente ou amigo meu. E reflito muito acreditando que um incidente desse poderia acontecer com qualquer um. Ou melhor, não deveria, mas infelizmente acontece.

Um dos fatos atenuantes deste caso na minha visão, é que a morte ocorreu dentro do estádio. Sinceramente, não me lembro a ultima vez que um torcedor morreu dentro de um estádio por conta da violência. No começo dos anos 1990, na Batalha campal do Pacaembu, ocorreu uma guerra entre Palmeiras e São Paulo. Imagino o que não repercutiu.

Infelizmente, por mais irônico que pareça, hoje em dia estamos "acostumados" com as mortes nos entornos dos estádios, ou em encontros que os vândalos marcam antes ou depois dos clássicos. Mas raramente dentro do estádio, com a bola rolando.

E pior do que isso. Quando bandidos se matam em encontros marcados, muitos de nós pensamos "o cara também procurou", "problema é dele". Agora, no caso de Kevin, é algo muito, mas muito indignante. Ele estava lá simplesmente para ver seu time estrear na Taça Libertadores 2013, e não conseguiu assistir mais do que 5 minutos de jogo.

Bom, aproveito este espaço e pergunto a você, raro e caro leitor, qual foi sua primeira partida, com e sem algum responsável? Você deixaria seu filho ir com 12 ou 14 anos a um estádio sozinho? Depois do ocorrido da semana passada, hoje, minha resposta seria não.


Nenhum comentário: